holy moments of a waking life

07 fevereiro 2006

"Antes do Pôr-do-Sol" antes do amanhecer

Esse post tem tudo pra ser meio doido. Pode ser que, no final, depois de escrito, nem seja tanto quanto eu esperava, há a chance de ser meio chato até. Mas a questão é que as idéias de onde ele germina e se alimenta são inquietantemente boas, prazerosas, positivas. Fazendo referência a um termo que não uso faz algum tempo, diria que esse redemoinho de idéias e sensações, juntamente com o fato de tê-lo percebido, foi mais um holy moment. É provável que o texto não tenha a menor graça para quem possa ler essas linhas, mas tenho certeza que terei enorme prazer em escrevê-las.


Acabo de ver Antes do Pôr-do-Sol. Já havia visto Antes do Amanhecer e tinha colocado o trabalho na minha lista de favoritos. Agora, coloco mais este, o que totaliza três filmes de Richard Linklater entre meus filmes prediletos (o terceiro é Waking Life). Não tenho essa coisa de "diretor favorito", mas depois dessa coincidência, confesso que vou olhar com olhos mais atentos o que esse cara venha a produzir. Bem, mas meu gosto cinematográfico não vem ao caso nesse post, a não ser quando se fizer necessário o comentário para ilustrar a “cena” maior que pretendo rodar aqui.

Já fiz referência aos dois “Antes do...” em um post anterior e, relendo o que escrevi, parece que não fui muito sincero (a propósito, tenho que escrever sobre isso, principalmente depois do grande papo com o Negão, a Dna. Grace e o Baiano hoje... mas isso fica pra depois). Dei a impressão, de maneira não-intencional, que já havia assistido os dois. Na verdade, eu só havia visto o primeiro e ouvido muito sobre o segundo. Muitas opiniões, mas pouco sobre os detalhes da história. Vendo o filme, vê-se o porquê: assim como o primeiro, Antes do Pôr-do-Sol é um grande diálogo sobre nada e sobre tudo ao mesmo tempo, protagonizado por um casal – um americano (Ethan Hawke) e uma francesa (Julie Delpy) – que se reencontra em Paris nove anos depois de se conhecerem em Viena (vide primeiro filme). Agora com 32 anos, com vidas diferentes e encaminhadas, os dois retomam o papo ignorando os anos de distância e discutem o que teria acontecido se um encontro marcado para seis meses depois da despedida em Viena tivesse acontecido. Na minha opinião, aí está grande parte da magia do filme.

Peguei o DVD porque já tinha a ingênua impressão de haver nele nuances que anda(ra)m bem nítidas na minha vida nos últimos tempos. Por certo essa sensação não é exclusividade minha, deve ser de muitos inclusive, afinal um bom filme faz sucesso quando consegue, entre outros fatores, permitir que o espectador se veja de alguma forma nele. Seria legal ter visto esse filme com alguém que partilhasse da mesma história e tenho certeza que a sensação seria forte, patente. No entanto, comecei a me assustar quando percebi que as semelhanças comigo e minha vida nas últimas semanas eram maiores do que imaginava.

É engraçado como às vezes a vida na tela se entrelaça e se mistura com a vida real. Me parece que são poucos os diretores que conseguem fazer um trabalho que chegue no "limite da verossimilhança", tornando a vida de alguns espectadores viajantes (como eu!) mais poética talvez. Tirando o fato de que tenho praticamente a mesma idade do personagem e gostar muito de escrever (o cara é escritor), partilho da mesma visão otimista e romântica da vida. Um exemplo que ilustra bem o caso é quando o personagem afirma que o mundo está melhorando e compara o planeta com a evolução do próprio ser humano. Ele não lamenta o fato de estar envelhecendo. Ele comenta que certamente está ficando menos saudável, mas ele também era mais inseguro quando jovem e hoje sabe lidar muito melhor com seus problemas. Dia desses, estava eu comentando que não troco meus 30 pelos meus 20 anos por nada. Além disso, falando de relacionamentos, o casal discute a idéia de que só somos felizes com outra pessoa ao nosso lado. Por mais que eu ache essa questão assustadora e incontrolável, tenho a tendência a dizer que concordo. Talvez eu não seja tão restrito a ponto de dizer que só é possível ser feliz se tivermos alguém, uma namorada ou esposa, mas acredito hoje que pra ser feliz precisamos SIM de uma conjunção de namorada/esposa e amigos. Hoje, é como eu vejo, é o que vale pra mim. Estou tão certo disso como estou certo de que posso mudar de opinião daqui uns anos. Amanhã, eu não sei. No entanto, não quero me divorciar com 50 e poucos anos, lamentando que não tive uma vida como eu queria, mesmo sabendo que isso é possível de acontecer. Não quero viver com alguém de maneira infeliz, “aturando” coisas pelo simples fato de a outra ser legal, ser uma boa mãe ou, dentro do meu momento de vida, por ser uma parceira pra festas e conversarmos sobre vários assuntos. Essas são todas qualidades importantes e desejáveis, mas a relação pra mim é mais do que isso: é respeito, admiração, emoção, “plins” e – last but not the least, for sure – atração, tesão. Como diz o cara no filme, life is more than commitment. It has to be.

Quem ler esse parágrafo anterior pode achar um tanto óbvio esse desejo, mas tenho visto que não é. Isso não é nenhuma indireta pra ninguém, é só uma constatação. Quantas vezes já não dissemos, frente a cena de um filme, “pô, que cara pato!!! Por que ele não faz isso?” Não fazemos isso também quando aconselhamos um amigo ou julgamos um conhecido? Temos muitos medos, pudores, medo de magoar pessoas que não merece(ria)m ser magoadas, enfim, muitos fatores nos rodeiam e nos impedem de ou atrasam para agir. E vários filmes, aqueles que podem entrar pra galeria das “boas obras”, retratam essas nuances da natureza humana. E tais nuances não são nenhum defeito, na minha opinião. É sinal de que não saímos por aí exercendo nossas vontades a torto e a direito, a despeito de quem pode ser diretamente atingido por elas. Isso é bom senso, meu amigo. E isso é extremamente desejável também.

Voltando ao “limite da verossimilhança” do qual falei ali em cima e buscando evidenciar que a "vida na tela" é bem mais próxima da "vida na vida", seria improvável que Jesse e Celine se reencontrassem nove anos depois, vivendo em países diferentes, sem ter telefones ou endereços um do outro e principalmente depois de um reencontro frustrado. Imaginem um reencontro depois de 15 anos. Jesse e Celine, após o encontro em Viena, chegaram a morar na mesma cidade, passaram pelos mesmos lugares, tendo o cara imaginado tê-la visto entrando em uma loja no dia em que casou. Ironicamente, ela morava a duas quadras de tal loja. Imaginem guardar tão bem um sentimento pra si, ao ponto de esquecer tê-lo outrora sentido. No entanto, um simples reencontro (não tão simples talvez) traz à tona tal sensação e a deixa viva como antes foi. Mais ainda: nunca imaginar que a recíproca é verdadeira e descobrir de uma hora pra outra que o sentimento é tão recíproco quanto podia ser. Cada dia que passa, percebo que nossas vidas são mais parecidas com uma novela ou um filme do que poderíamos imaginar ou gostaríamos que fosse. Não no sentido de que as coisas são programadas e já escritas em um roteiro divino, mas sim dentro de uma tormenta de possibilidades que se abrem a cada momento, cabendo a nós – os atores – play our part ou recusar o papel e ficar assistindo. Me agrada a idéia de ver minha vida de forma poética, romântica (não necessariamente no sentido amoroso, mas “novelesco”), como se cada momento pudesse se constituir como uma cena, a qual poderia ser incluída na versão comercial – aquela que vendemos pros outros – ou figurar apenas na versão director’s cut. Gosto da idéia de me ver como protagonista do meu filme e dividir a cena com aqueles que me rodeiam ou entram e saem da minha vida, ao mesmo tempo que tenho prazer de me “ver” como coadjuvante da história dos meus próximos. E hoje, o filme em cartaz seria, certamente, algo muito parecido com Antes do Pôr-do-Sol.

Bom, já tô mais relaxado agora. Espero que o post não tenha ficado muito enrolado (vã ilusão). Seis e meia da manhã, tá na hora de dormir. Pra alguns, de acordar. Daqui a pouco eu volto.

2 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Acho que peguei a idéia do teu livro (entenda-se post), mesmo não tendo visto o filme. E é outro que dá pano pra manga, mas o espaço aqui me parece insuficiente. Prefiro aguardar até sexta-feira (quando termino de tomar remédios ruins) e dicuti-lo tomando remédios bons e gelados :-). E ve se vai dormir tche!!! :-)

Abraço.

fevereiro 07, 2006 11:25 AM  
Anonymous Anônimo said...

Nooooooooooossa!!! É um verdadeiro tratado!

Tem assunto aí pra muuuita cerveja...

;-)

fevereiro 07, 2006 3:04 PM  

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